quinta-feira, 10 de maio de 2012

A mídia está na berlinda


Charles Scholl

Consultor de Comunicação Social

A crise da vez em nossa República, desencadeada pelas curiosas relações do Senador Demóstenes Torres com conhecidos contraventores, aponta indícios da relação de grupos criminosos que promovem sistematicamente escândalos nacionais com fatos e fontes duvidosas. A prática tem por objetivo combater adversários em disputas empresariais e políticas. No epicentro do motor de geração da instabilidade os meliantes se utilizam da Revista Veja, que foi reduzida a um folhetim político partidário. Nesse meio, o contraventor Carlinhos Cachoeira se constituiu como o maior pauteiro da referida publicação da Editora Abril, sempre com o objetivo de eliminar a concorrência para obter mais lucro para seus empreendimentos e promover políticos que se comportam como empregados representado os interesses corporativos da iniciativa privada no cerne do Poder Republicano representado no Congresso Nacional.

Mídia e poder

O assunto do poder concentrado da mídia passa a ter dimensões importantes quando nos damos conta de que falamos e compreendemos a realidade a partir de mecanismos informativos, que nos dão a noção do que acontece em nossa cidade, de veículos que falam como pensam os gaúchos, como agem os brasileiros e os demais acontecimentos no mundo. A frase parece inócua, óbvia e desprovida de qualquer elemento retórico surpreendente. Porém, essa obviedade citada acima expõe uma fragilidade que se torna especialmente perigosa se somada a falta de senso crítico sobre as publicações. Ocorre que grande parte do que falamos no cotidiano são assuntos em que não tivemos uma relação direta com o fato ocorrido que estamos comentando. Isso é o mesmo que dizer que nossas conversas são pautadas pelos veículos de comunicação, como jornais, rádio, televisão e, mais recentemente, a internet.

Em um sistema político e econômico dito democrático, cidadãos sistematicamente são chamados para manifestar sua opinião acerca dos assuntos de interesse público, assim como decidem sobre o que consomem pelas ofertas que brotam em todos os lados. Com isso, podemos compreender que a opinião pública tem grande força e os veículos de comunicação possuem uma relação direta com a opinião pública pela difusão de informação em larga escala. Grosseiramente temos nesta breve explanação uma síntese do poder da mídia.

Opinião Pública & interesse privado

No epicentro da crise do momento está o meliante contraventor Carlinhos Cachoeira e seus asseclas, entre eles um senador que quase virou ministro do Supremo Tribunal Federal. Os principais fatos acerca do episódio em torno do Senador Demóstenes Torres Ex-Democrata  estão recebendo ampla cobertura por parte da imprensa nacional, porém a relação escandalosa que envolve a Revista Veja como um instrumento ao serviço dos grupos criminoso, tem sido ignorada pela Rede Globo e pelos veículos de maior tiragem no País. O assunto só foi importante na Rede Record, que neste caso demonstra não ter comprometimentos com a linha política adotada pela Editora Abril.

O caso está sendo muito bem abordado pela revista Carta Capital, lançada 9 de maio, que denuncia o movimento de Carlinhos Cachoeira e Demóstenes Torres contra a cúpula do PT personificada no ex-ministro José Dirceu. A reportagem descreve como as denúncias sem sustentação serviam para acuar os adversários de um esquema criminoso, desde a invasão ao hotel Naum, que tinha por objetivo plantar um escândalo nacional, até a campanha para levar Demóstenes Torres ao Supremo Tribunal Federal. Não se trata de questões do passado, mas de práticas muito atuais que tem objetivos nefastos de eliminar concorrências, tal como ocorreu em 4 de junho do ano passado, quando Cachoeira recomenda a Claudio Abreu, diretor da Delta no Centro-Oeste, para passar informações à revista Veja sobre a licitação da BR-280 e sobre uma reunião que teria havido em Curitiba. Textualmente Abreu desponta o desafio de como derrubar a concorrência para se beneficiar de 25% do negócio da obra. Não se sabe ao certo o alcance da prática nefasta, porém a Delta é a empresa que mais ganhou licitações para execução de obras do PAC.

Espantoso e comum na nossa história

A questão “mídia e poder” é um tema argiloso para ser tratado no Brasil, mesmo depois do reestabelecimento da democracia. Estudei o assunto ao lado do Professor e pesquisador Antônio Fausto Neto. Após muita prática do exercício da pesquisa, o trabalho de análise dos conteúdos midiáticos nos lembra uma psicanálise social. Para isso, é fundamental a atuação de profissionais do meio que façam análises críticas e a defesa da liberdade de expressão e da ética no exercício do jornalismo. Essa análise psicanalítica da sociedade qualifica a opinião pública e contribui para a compreensão de que a liberdade de expressão e a ética no jornalismo são referências para medir a saúde democrática de uma nação. A democratização da comunicação é um movimento político que pressiona o aprofundamento e a maturação dos processos democráticos do País. A revista Carta Capital sita o ObjETHOS – Observatório de ética Jornalística, entidade criada pelo Professor da Universidade Federal de Santa Catarina, Rogério Christofoletti, que relata a dificuldade de manter limites na relação entre o jornalista e a fonte e afirma que o trabalho passa a adentrar em um terreno perigoso no momento em que compromete a credibilidade do relato.

Democratização ou centralização?

As últimas duas, das nove páginas da reportagem foi dedicada a reproduzir um texto de David Puttnam, um Lorde do Partido Trabalhista que presidiu a Comissão Conjunta de Análise Parlamentar para Lei de Comunicações de 2003, que fala do autocrata Rupert Murdoch e seu filho que mantém as estratégias de sua família. A comparação do caso tupiniquim com os Lordes se dá pela concentração de poder como um caso comum e que está sendo enfrentado em todo o mundo como algo ruim à sociedade. No Brasil, diria que Daniel Herz trouxe ao meio acadêmico e popularizou a crítica da mídia como uma qualidade, principalmente com a edição de sua obra “A história secreta da Rede Globo”, que rendeu o documentário “Muito além do Cidadão Kane”, de Simom Hartog. Com a morte do diretor o documentário ficou nas mãos do produtor John Ellis, que em 2009 vendeu seus direitos autorais para a emissora do Bispo Edir Macedo, a Rede Record, por US$ 20 mil, numa estratégia de atacar a Rede Globo. Em seu livro, Herz traz à superfície em seus agradecimentos outras autoridades do assunto, como Adelmo Genro Filho, Tau Golin entre outros professores universitários que se destacaram com suas análises críticas. Hoje, penso que a principal referência no movimento pela democratização da comunicação é o professor Pedro Osório, que atualmente dirige a Fundação Piratini. Em sua atuação frente a fundação destaca-se a aquisição de 16 retransmissoras que estão sendo instaladas no Rio Grande do Sul, ofertando alternativa da TVE para 3,8 milhões de pessoas em solo gaúcho. Mas compreendo que ainda estamos distantes de dar a devida importância à pulverização de veículos de comunicação, em contraponto as políticas de centralização de poder, que não contribuem para a real emancipação cultural das pessoas, elemento fundamental da cidadania.










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